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O bullying é um dos mais sérios
problemas recorrentes em escolas e universidades, e sua questão vai
muito além de agressores e vítimas "Começaram a surgir
vários apelidos ridículos e eu não tinha mais amigos, vivia me
escondendo. Quando terminava a aula, ia embora direto para casa, na
maioria das vezes chorava para minha mãe dizendo que não queria ir mais.
Tive que mudar de escola por ser chamado de 'viadinho' por vários
moleques, foi muito humilhante". O relato da adolescência do
administrador Ricardo Almeida, hoje com 28 anos, representa um dos
grandes problemas que acontecem a diversos jovens nas escolas e
universidades: o bullying.
Caracterizado por uma agressão
intencional e repetida, o bullying pode causar intensos danos
psicológicos à vítima, afetando diretamente seu convívio social e
familiar. Qual gay ou lésbica já não foi alvo de piadinhas e risadas
abafadas nos tempos de colégio? Muito mais do que simples brincadeiras,
as ações do bullying podem ficar para sempre no imaginário da pessoa:
como as experiências acontecem quando a vítima é criança ou adolescente,
a prática pode influenciar diretamente na formação de sua personalidade
e caráter.
O publicitário Guilherme de Almeida, de 23 anos,
carrega até hoje o sofrimento que passou na época de colégio. Guilherme
era constantemente zoado por seus amigos por sua orientação sexual
(sendo que na época ele ainda nem saía de fato com homens). "Hoje, quase
não tenho memórias desta época. Foi tão difícil que acabei bloqueando
tudo em minha cabeça", comenta.
Entre agressor e vítima"O
ápice do preconceito foi da 5° série ao 1° colegial, quando me chamavam
de 'bicha', 'viado' e o professor ainda ficava rindo da minha cara.
Certo dia, um aluno me viu numa balada gay e contou para o diretor que,
por sua vez, falou para eu tomar cuidado com essas 'coisas'. Não sei o
que machucava mais, quem me zoava ou quem ria", lembra o publicitário.
Na
prática do bullying, há um elemento muitas vezes deixado de lado, mas
que representa uma das grandes forças para a continuidade das agressões:
a plateia. "Sem plateia, não tem tanta graça. A plateia ri e aplaude
por medo de ser a próxima vítima se não aderir. A intimidação serve para
todos", explica Maria Isabel da Silva Leme, psicóloga e professora de
psicologia da USP. Sem a plateia, o agressor não tem seu palco de
atuação. Sem palco, a "brincadeira" não tem fundamento. É a história do
circo e do palhaço.
Segundo Marisa Isabel, os educadores têm
papel fundamental nesta luta. "Os educadores precisam fazer um trabalho
de conscientização com os alunos sobre princípios éticos como direito ao
respeito, justiça... Uma oportunidade excelente é promover discussões
coletivas sobre a disciplina na escola, fazer isso ouvindo a opinião dos
alunos, fazendo acordos com eles sobre as regras para que se sintam
também responsáveis pela qualidade do convívio escolar", explica. Da
mesma forma, os pais devem atuar ao lado dos filhos. "Os pais não podem
achar que a escola deve educar integralmente seus filhos, sem assumir
responsabilidade pela sua educação", complementa.
Como na maioria
das vezes os agressores são menores de idade, nem sempre a punição
devida é realizada. Porém, há caminhos para recorrer: "A escola,
principalmente a pública, tem reportado as ocorrências ao Conselho
tutelar e até à polícia. Acredito que os pais e o transgressor sejam
chamados para esclarecer o que ocorreu e só isso deve dissuadir muitos
provocadores", afirma Marisa Isabel.
Além disso, segundo a
psicóloga, a vítima tem que aprender a se defender, a falar que não
gosta de ser zoada, a procurar sua posição de respeito na turma sem
agressão ou violência. O poder da vítima do bullying deve ser a mesma
arma utilizada pelo agressor, mas usada de forma benéfica: a voz.
* Matéria originalmente publicada na edição nº 37 da revista A Capa. |
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